sexta-feira, 4 de julho de 2014

welcome, babe

O processo que sofri para poder escrever uma tese foi devastador, em sentido positivo e, lógico, negativo.

O primeiro passo foi a compreensão de que, por um tempo ainda não certo (somente previsto), seria necessário se afastar das pessoas (i) para ter mais tempo para escrever e (ii) para não machucá-las em eventual crise de identidade ou ansiedade (enumerar itens é uma das manias adquiridas). Esse afastamento que, com certeza, acarreta um isolamento total, é a base fundamental para alcançar o fundo do poço inexorável para que você só precise de você. Aí está a condição emocional que fora imprescindível para mim.

Nesse fundo, a única pessoa que eu tinha mais por perto era eu mesma, e, como fazia tempo que eu não me via de perto (estava apegada a outras coisas), passei a questionar muito das razões e dos impulsos que me levaram a tal caminho. Foi uma briga um tanto quanto desleal: meu cérebro sabe ser muito ruidoso e ruinoso quando quer apontar erros e enganos. Mas, dessa batalha, sobrevivi com a única certeza de que o que eu estava fazendo era a única coisa que eu deveria estar fazendo naquele momento. Conclui que tudo o que eu fiz e todo o universo colaborou para aquele momento. Ali, então, pode-se passar ao segundo passo.

O segundo momento é acreditar em si mesmo. Com todo isolamento emocional, não haverá vozes externas o suficiente que lhe digam que você pode fazer algo: será você mesmo que terá que fazer isso. E, é engraçado, porque você precisa fazer isso depois de uma batalha algoz e, ainda, ciente de seus defeitos (sim, a condição para tudo isso é estar consciente o mínimo de si), acima de suas qualidades. Não é algo fácil. Uma nova retrospectiva de suas vontades e conquistas se faz urgente para que você consiga escrever uma linha e articular um argumento - é esse resgate de você mesmo que te fará acreditar em si mesmo.

Isso independentemente se o seu passado foi bom ou ruim: a indicação de tais juízos é feito de modo subjetivo; assim, caso você perceba que seu passado foi ruim, a primeiro momento, será necessário se esforçar mais um pouco para mudar o prisma e extrair, dele, experiências positivas. Para que faz isso cotidianamente, nesse momento será crucial.

Para um terceiro momento, vem a persistência e a resistência. Pessoas externas (todas as pessoas além de você) poderão tentar interferir no seu processo de isolamento - o importante é não deixar o trabalho atrasar. Se isso acontecer, será preciso enxergar que a responsabilidade era sua e que a pessoa não é culpada. Caso tal percepção não aconteça, prepare-se para perder alguém querido, pois seu ímpeto de proteção à tese será enorme.

Ainda, será preciso força e condicionamento rigorosos para você ter a disciplina de focar em seu trabalho. Não que tenha um horário certo (o que seria o ideal), mas que estude com frequência diária e por horas ininterruptas - a continuidade do pensamento é muito importante nesse período. Particularmente, aprendi a conhecer energéticos (das mais diversas marcas, o que foi uma pesquisa experimental em paralelo, com foco nos efeitos de cada marca em meu organismo) e alguns deles me auxiliaram na persistência de continuidade por horas em cima do trabalho.

Agora, vejo que é possível que eu tenha me arriscado demais nesse processo, com tanto isolamento e ingestão de energético. Por quê? Porque alguns energéticos, pelo menos em meu organismo, não acostumado a nenhuma substância que produza grandes efeitos com tais, tendenciou-me a muitas coisas que, talvez sem o energético, eu não faria. Não sei; não vou usar a velha desculpa do "foi a bebida", mas é algo com que eu tenho que pensar. Não só o energético, mas, quem sabe, a sua mescla com o isolamento. Para quem é sociável quando quer, a obrigação de se fechar totalmente pode ser desastrosa.

Seguindo isso, foi inevitável a conclusão da tese. Com muitos choros (especialmente no momento de redigir a dedicatória), lamentos e, principalmente, alegria. Já chorava ao pensar no momento em que iria conclui-la, chorei quando a vi sendo impressa no xerox. Apesar de eu estar no estado puerperal, como diz o meu orientador, a revisei até o último minuto e estou muito satisfeita pelo que fiz - lógico que o resultado da banca é outro assunto, mas, por ora, está ótimo.

Se eu pudesse me abraçar, cara... :D

E agora, na noite em que eu poderia mais dormir após a tese, eu me vejo com insônia. Antes, sonhei muito e despertei num susto, como se tivesse alguém me acordando. Eu acho que era eu mesma, me acordando de toda essa fase e de todo esse isolamento.

Passaram-se meses de clausura emocional e intelectual. Permiti-me sentir poucas coisas nesse período, assim como estudei poucos temas além do tese - somente o essencial para conseguir honrar minhas obrigações de trabalho. Só.

Nesse isolamento, nem senti o tempo passar - perdia-me fácil nos dias da semana, nas horas do dia, nos meses. Chegava a dormir horas à tarde (quando podia) para escrever à noite. Não tinha sábado, nem domingo. Só tinha dia de tese e cerca de 4 a 5 horas dedicadas a ela.

Roupa suja no cesto, que eram lavadas somente uma vez por semana; pilha de roupa a passar por meses; casa mais ou menos limpa; almoços com a frequência de um prato em específico, com poucas variações. Nos últimos dias, deixei de lado a atividade física e a preocupação em tirar a maquiagem no final do dia. Isso foi sério.

Hoje eu acordo, então, e vejo toda essa realidade que me é um tanto quanto estranha, pois parece que ainda estou no início do ano - como se eu não tivesse sentido realmente tudo isso que aconteceu (mas sei exatamente e bem próximo o quanto doeu)- , mas que também é bem conhecida: não posso voltar atrás, pois, agora, o caminho é só para frente - especialmente porque a gratidão de ter chegado nesse ponto supera qualquer dor, perda ou isolamento.

Esse ponto é o ponto de contato consigo mesmo, de um reencontro com a  única pessoa que não pode te abandonar e com a única que, nas crises, você deve ter certeza que pode contar: você mesma.

Assim, seja bem-vinda novamente, minha querida.