Deixo a cidade de meu nascimento com poucas e fortes raízes experienciais e pessoais, estas que não se desfarão com o meu distanciamento espacial, pois já se mantêm com a ausência pelos estudos e trabalho - sorte não seguida pelas raízes fracas e passageiras.
Ficam aqui as ruas asfaltadas por onde caminhei, corri, andei de bicicleta, fugi de moto, passeei de carro, brinquei de patins e caí de skate. As calçadas (e suas árvores com lindas raízes quebrando seu concreto) por onde sentei e conversei. Pátios, palcos, salas e quartos onde dancei. Tatames e carteiras onde lutei. Rede, camas, sofás, chão onde dormi e descansei.
Ficam meu anos de estudo até a primeira pós-graduação, meu estágio, meus primeiro emprego. A praça da melhor idade perto do mercado. As ruas decoradas no mapa mental e as rotas de fuga da chuva (cara, eu sou - por enquanto - a única pessoa que conheço (¬¬) que tem noção das rotas mais emocionantes e eficazes para fugir de um alagamento em Joinville - de carro!). As trilhas dos parques ecológicos e seus insights.
Até pouco tempo atrás, andei por essas rotas de fuga e trilhas tortuosas como alguém sem rumo, apesar de ter objetivos bem traçados - alguns, porém, um tanto inocentes e impróprios para a época atual. Talvez essa divergência que tenha gerado a cisão entre método e meta. Nessas sinuosidades, a maioria das portas estavam fechadas e apenas algumas frestas se mostravam convidativas.
Precisei entrar em um regime de conscientização e humanismo para poder passar por elas. Cortei muita inutilidade, mitos culturais (bem difícil em uma cidade de típica, forte e atual colonização), ruídos comunicacionais. Tive que ver que eu transmitia uma mensagem equivocada sobre mim - só assim entendi porque havia tantos parvos ao redor: atraídos por um erro que exalava de mim.
Aqui aprendi, experiencialmente, parte do meu objeto de estudo atual: as pessoas podem te tratar como um outro (alguém indiferente), como um não eu (alguém contrário a ti), como um objeto (como um objeto!) ou como um humano (como um outro eu). Isso vai depender do que você aceita, rejeita e transmite.
Pelas frestas, passei. Se foi taxativamente bom ou mau, não vou poder nunca afirmar. Agora, para mim, foi ótimo. Não sei dizer que isso era permitido (afinal de contas, o que é e o que não é permitido e qual a hierarquia que estabelece isso?), só tenho noção de que cheguei a um meio que parece a estrutura do labirinto: onde eu pude conhecer o que eu somente farejava. E foi bom por isto: conheci, como a arquitetura de um sistema, o que era uma tendência sensitiva daqui de dentro.
Chego em um lugar em que eu consigo ver quais erros cometi e que não cometerei mais e os erros que ainda cometo. Erros pautados em padrões que assumi conscientemente durante a viagem pelas trilhas e na passagem pelas frestas. Quando os padrões mudarem, talvez não sejam mais erros. Talvez cheguem a ser, simplesmente, atos comissivos e omissivos. Só. Porque, de fato, são assim mesmo. Ou não.
Deixo o conhecido tortuoso e o aparentemente seguro para estar, agora, em um lugar onde nunca estive, mas um lugar onde as paredes e muros ainda não foram grafitados, onde os vidros ainda não quebraram com a minha voz, onde ainda não pinguei publicamente nenhum suor.
Não sei, mas para onde vou, os sorrisos parecem mais fáceis e os abraços, mais confortáveis. Há mais portas - mas creio que isso não significa que todas estão certas. Mas a trilha é mais aberta e mais iluminada. Especialmente porque, em seu delineamento, estão as raízes fortes e essenciais que me amparam no cansaço e me fortalecem no ânimo. As que foram criadas no momento de dúvida e certeza, quando eu estava certa de que a certeza era absurda e quando eu mais acreditei em mim, tanto que mudei.
Mudei no ano, no dia, de casa, de msn, de virtudes, de vícios. Deixo a casa branca com janelas e portas marrom, escolhida por outrem, para a casa rosa com flores na sacada, escolhida por mim.
Agradeço a esta cidade por todas as oportunidades que me foram dadas e
por todas as que me foram negadas
- só assim pude perceber que o céu é, na verdade, imenso para as asas que querem voar
e pequeno demais para as que foram aparadas por mediocridades,
preconceitos, pré-julgamentos e medo.
Por isso, ou não saem do lugar ou colocam obstáculos ao voo dos outros.
Bjão Grazi, tudo de melhor pra ti.
ResponderExcluirSe cuida =*