domingo, 18 de abril de 2010

Voltamos à programação (estratégia) normal...



Morin diferencia as circunstâncias de utilização de programa e de estratégia e vincula os seus conceitos à forma de pensamento científico tradicional e ao pensamento sistêmico (in Introdução ao pensamento sistêmico).

Explana o Autor que a ação supõe complexidade e que, para sequências integradas a um meio ambiente estável, convém utilizar programa e que este não obriga estar vigilante, a inovar. Por outro lado, a estratégia é utilizada em sistemas de acaso, quando a construção do jogo se faz na desconstrução do jogo do adversário ou do ambiente. Como o campo da ação é muito aleatório, ele impõe uma consciência bastante vigilante nos acasos.
A complexidade, portanto, não é uma receita: ela nos mostra que é errôneo o estado de “fechado” aos fenômenos, que se utiliza de programas para a experiência: o pensamento deve permanecer aberto, utilizando-se de estratégia para resolver os problemas.

Mesclo tais definições com algumas observações que já fizera há alguns anos - e mesclo com alegria tendo em vista que essa é uma prova de que minha loucura não é filha única.

Há pessoas programadas; há pessoas estrategistas. Estas, raras; aquelas, aos montes.

As pessoas que agem por meio de programas mentais, condicionamentos linguísticos e corporais, são viciadas em atitudes repetitivas e a previsibilidade de suas respostas varia de óbvia para "eu sabia se prestasse melhor a atenção".

São seres que aceitam facilmente o que lhe é proposto/imposto, que não perguntam, que não questionam. Esbarram no primeiro obstáculo e vociferam: "Deus que quis... devo continuar onde estou", "aquele destino não era o meu", "sou assim mesmo, não vou mudar."

Resignam-se nos muros construídos por terceiros (desconhecem suas próprias limitações), têm como verdade absoluta sua maneira de viver (não percebem nada além das muretas) e são intolerantes aos pontos de vista, às condutas, às culturas que estejam em desconformidade com sua visão unidimensional.

Visão unidimensional determinada pelo programa gravado em sua alma pela repetição de comportamentos, próprios e de outrem, que impingem uma só maneira de agir;  imput e output congnoscíveis pela simples observação e manipuláveis facilmente - dificilmente, contudo, a manipulação dar-se-á além dos limites programados. Se algo exceder o conteúdo interno, o sistema entra em pane, revolta-se, rebela-se, esperneia que nem uma criança e, o pior: faz manha e tenta manipular também, mas para que se restabeleça o estado de conforto.

A segurança só retornará, contudo, se o causador da pane se afastar, permitindo, por consequência, que aquele programa continue em funcionamento, ou se o formatador for benigno ou maléfico para, conhecendo seu código fonte, insistir na manipulação do sistema, respeitando as barreiras de ação.

Nesses termos, vê-se a outra figura: o causador da pane, o formatador. Esse é o estrategista.
É aquele que constrói ou destrói os programas. Sua única imposição visível (considerando que, a cada dia, procura os cercadinhos colocados por outros e os retira, calmamente, ampliando sua visão) é a reflexão cotidiana sobre a complexidade de si e do que pode observar. Atém-se às derivas, às bifurcações, às variáveis, à hipóteses - quase um metodólogo nato.

Sabe notar a mudança sutil da rotina, esforça-se para se manter lúcido aos movimentos fictícios criados pela sociedade, busca renovar sua mente a cada momento e pensa: "eu posso estar pensando equivocadamente - de novo".

Sua estratégia é olhar para cada instante e ali, no calor da situação, no meio da rua, decidir qual a  melhor opção, levando em conta todos os elementos que possam influenciar em seu comportamento e nas consequências deste. E não decide secamente: ele edifica uma decisão.

E tem consciência que sua história não para no "feliz(es) para sempre", visto saber que o script de um conto de fadas serve, apenas, para sedimentar determinadas "verdades humanas" no imaginário infantil. Tão logo possa a pessoa se determinar, no entanto, deve se reintroduzir ao caos (desmistificando suas impressões, distinguindo chiqueirinhos, negando autoridades totalitárias), e, se possível, reestruturar o seu próprio caos de modo que lhe seja mais interessante.

Até é possível, portanto, que o sapo tome conhecimento de sua existência e venha a se transformar em um príncipe. Mas esse é um processo interno, que não se condiciona, necessariamente, ao beijo de uma princesa.


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