segunda-feira, 24 de maio de 2010

Sou marginal e tatuada, sim, e daí?

*só não fumo :P

Coloquei um rap, ajeitei-me na cadeira e vamos lá falar algo sobre mim  - com inspiração advinda do post da Fernanda Renaux (recomendo!), no blog da Cultura do Controle, sobre um assunto que há tempos já estava remoendo.

Naquele post, a Fernanda comenta ser uma transgressorinha de estimação, no sentido de que tornaram-na "um idolozinho doméstico: a revoltadinha da titia; a chatinha com personalidade forte (forte, eu?), a menina que preferia os livros aos meninos (eufemismo para não dizer que eu não preferia os meninos)".

Identifico-me com ela no que se refere a ser apelidada de revoltada (sem a sutileza do diminutivo), o que nos proporciona o encontro no caótico da transgressão de regras - aquelas inúteis, chatas, convenientes (só para o "social" ou para a imagem) e que refogem de toda individualidade. Unimo-nos da identidade autônoma.

Divirjo, contudo, na estimação dos outros, pois me situo em posição totalmente contrária: a do medo.

Desde criança não ia a festas familiares de aparência - preferia o distanciamento à falsidade da maioria das pessoas. Isso continuou, por consequência, na minha adolescência; consigo contar com uma certa facilidade todas as vezes em que fiz um social, fui a uma festa, a uma balada.

Sempre noticiei a superficialidade de tais ambientes - e quem me conhece e me é companhia há anos sabe bem de como eu repiso essa observação. Já frisei tanto que até me canso em quando me vejo a responder para alguém acerca das minhas razões de preferir uma cama aconchegante, um sofá e um bom livro, um jantar e ótimas companhias: é a essência das pessoas com que quero ter contato.

A diversão de bar, o lazer da dança, o encontro de fim de tarde? Só tenho plena alegria com quem já conheço, de quem sei o cheiro, de quem sinto falta da risada. Gosto de quem sabe conversar sobre as profundezas de um amor, as sutilezas de um toque e de um olhar, o susto de uma descoberta argumentativa, o soco que é uma maldade ao ser humano. E, noooo, eu me espanto de isso ser tão raro atualmente.

É isto: gosto do que está por trás dessa crosta que usamos para viver em sociedade. Gosto de laços, porque os formamos na cor que queremos e do jeito que a intersujbetividade permitir; gosto de raízes, porque fugi de casa quando adolescente e sei o que é querer criar tudo do zero (e voltei, com o rabinho entre as pernas e, fatidicamente, tive que criar tudo do nada). Gosto de pertencer a algo sincero e gosto de gerar reciprocidade de um abraço. Gosto de uma galera unida e parceira. Gosto de companhia. Gosto de envolvimento, oras.

Gosto de intimidade. Para isso, para ficar perto, para chegar junto, não consigo fazer faces nem usar máscaras. Quando não me agrada, não me agrada e pronto: eu falo, com delicadeza, mas na cara. Posso até demorar para digerir o que está acontecendo, o que estou sentindo, mas expresso o que sinto sem medo.

No passado, tive problema com namorado e com amiga que imaginaram que eu estava indo contra a pessoa deles, e não somente contra uma ideia que eu não achei interessante ou coerente. Evitaram o meu argumento, achando que era ad hominem, e lá se vai uma resenha a pedir desculpas do além.

Mas uma hora cansei da irreflexão e da falta de alteridade de outro. Passei a dizer sim como sim e não como não e não mais pedir desculpa por algo que não fiz de errado. Por isso, certa vez, confundiram minhas palavras e intitularam-me de grossa. Que seja. Se entende mal e não pergunta para esclarecer, que continue me achando grossa (fui grossa?).

Os íntimos sabem o que se passa aqui dentro. Como diz o Rafa, é por causa da minha franqueza e da minha personalidade forte - sou um forte maleável, macio e flexível. Sei reconhecer quando erro, principalmente quando erro comigo mesma. E cansei deveras de errar comigo, por me envolver com pessoas que não era os meus e que não me conversavam nada além de trivialidades supérfluas - digo as supérfluas porque eu gosto das trivilialidades do Ser: um sorriso, o respiro, o vento, pássaros, verde-folha-nova, toque carinhoso, sol-ouro-reluzente, cheiro de chuva e grama, um olhar que diz muito, brisa da madrugada.

Assim, além de "grossa", chamaram-me de "nada a ver". Que seja. Não pretendo ser tudo a ver para quem disse isso - o que implicaria em eu ser fútil, ter preocupações de tendências da moda ou do BBB, ou de tentar pegar aquele gato que tem o carro tal.

Não, obrigada.

Por fim, decretaram: temos medo de ti. E mantêm distância. E agradeço.

Sei que a distância inicial fora declarada por mim, quando me ausentei dos sociais, quando neguei ficar com o queridinho, quando preferi estudar a sair para festar, quando me resignei a ficar sozinha a ter que suportar alguém que não sabe proferir o que eu e os meus entendemos. Não, obrigada.

Têm medo porque do que sou feita lhes é desconhecido, porque eu quero é moer esse vidrinho fino da sociedade - se eu não quebrei alguma parte, é porque eu não a vi ainda. Sou diferente, o que implica em dúvidas, em interrogações, em questionamentos limitados. Por corolário da limitação, suas respostas são limitadas: ela não tem nada a ver.

A ver com o que eles conhecem? Rá, não tenho nada a ver mesmo.

Tão logo comecei a pensar, entrei em discórdia com o mundo. Na juventude amiúde ficava amedrontado, pois supunha que a razão estava com a maioria. Helvetius foi o primeiro quem me alertou. Então, após cada novo cnflito, o mundo perdia cada vez mais, e e cada vez ganhava (...). O mundo tornou-se para mim vazio e ermo (...) (Schopenhauer, in A arte de conhecer a si mesmo).

4 comentários:

  1. Isso a partir da minha humilde postagem? Lisonjeada é pouco, tenho lido o teu blog e nele sempre me senti acolhida. Nada mais encantador do que ver escritas por outros nossas idéias nunca pensadas, mas nossas desde o nascimento: só precisávamos de uma forcinha no parto (e que outra sentisse as dores). Porque só se escreve assim a partir de cicatrizes, talhos, foras e passa-já! Escrita de vira-lata e não de podlle, de quem prefere uivar para lua a comer a mesma ração ordinária...
    (:

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  2. Fernanda, fiquei muito feliz com o seu post no Cultura do Controle e mais feliz ainda com o seu comentário.

    Seja bem-vinda (como sempre foi) ao Genealogia do Caos :D

    E, realmente, de acordo com essa classificação elitista de manutenção das estruturas falidas, sou uma vira-lata que prefere a liberdade das rua à correntinha de ouro da coleira :D

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  3. Como deve ser bom conseguir expor os sentimentos mais profundos. Tens este dom amiga!
    Cada post teu é um momento de reflexão de mim comigo. Muito show!!!
    Te admiro cada dia maissss Grazi!!!
    beijobeijo;))))))

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  4. Saber expor desse jeito assusta, Juuu :X
    Mas não tem como negar a natureza, hehe

    Brigada, minha linda e doce amiga :**

    Bjão :D

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