domingo, 15 de maio de 2011

Extremos identificáveis



Sábado, 18h30.
Uma multidão animada enche o silêncio exterior que me acompanha. Permito a intromissão positiva de seus sons em meu ser. Um grupo mais animado ainda em meu redor - ou eu ao redor dele. Todos empolgados para o enfrentamento e superação de mais um obstáculo, para o alcance de uma meta - que eles podem abandonar amanhã ou daqui a dois anos ou nunca, mas que, hoje, faz parte da batida de seus corações e, pelo menos hoje, eles precisam experienciar. É emancipador, livre, uma melhoria em suas estimas, uma definição de sua personalidade.
Não se rebaixaram às palavras venenosas que lhes lançaram; não demonstraram medo dos gigantes que disseram que iriam enfrentar. Demonstram coragem, atitude, orgulho de serem o que são. Humildade. Fé e esperança em quem são. Nem todos têm a capacidade de fazer isso. E isso é contagiante.
Tão contagiante que gera um movimento cíclico: a atitude expressada é aplaudida e acende a luz em outras pessoas, que se emocionam, mesmo que inconscientemente, com o que está acontecendo. Não é só mais uma apresentação, não são só passos contados e "surpresas" e improvisos. É luta por si, é luta pelo que acreditam, é atitude frente a uma gama imensa de marés contrárias. É a vida ansiando pela vida.
A plateia identifica-se, pois é desse tipo de manifestação de vida que está carente no dia-a-dia. É desse tipo de pessoas que falta o mundo. Pessoas que tenham peito e colhão para chegar a um local de plena visibilidade e apresentar a todos no que acreditam... e porque acreditam.
E a plateia retribui. A retribuição, em forma de gritos espalhados, palmas e gestos, indica o seguinte: Também acreditamos em vocês. Também acreditamos no que vocês fazem e acreditamos na luta por si e na coragem para vencer. Continuem! Não parem!
A vitória ainda não é declarada. Mas há a sensação de que uma declaração dessa se faz desnecessária porque a importância do que aconteceu supera qualquer enunciado institucional... e dá força para não desistir, para tentar novamente, em todos os casos.

Domingo, 00h45.
Chego em casa. Todos os sons ainda fazem parte de mim, toda a vibração ainda me percorre. Mas, nesse momento, preciso de algo diferente, apesar da luta ser a mesma: por si, pela coragem no que acredita, pela esperança em mim e no que faço.
A dimensão que preciso é outra.
Agradeço as representações de vida de hoje que até agora me acompanharam. Agora, preciso apenas de seus significados, pois os meus representantes vitais são outros (por enquanto). Convido o silêncio novamente a me fazer companhia e trago-lhe as suaves batidas de um violão clássico. E-mail,word, livros.
A cada presença na frente do computador (ou perante uma banca), não se nega que há vozes contrárias dizendo que "isso não é música" e pessoas que já se levantaram e foram embora, deixando-me a minha própria sorte. Não há plateia.
As batalhas travadas internamente são solitárias. É só você e você, prazos (que você mesmo marca para si e que você mesmo deve cumprir para os outros) e expectativas (não só as suas, mas de todos que sabem de sua condição). Não há muita torcida.
A inspiração é oferecida por aqueles que também batalharam e batalham, incessantemente, até o fortalecimento de seu caráter, até a vitória - cujo objetivo muda com o alcance. Acendam as luzes para nós, "não pelo que a gente faz, mas pelo que a gente ainda vai fazer" é o lema, por mais que o nós seja você, seu foco, seu coração, sua responsabilidade.
E esse é o resultado da fé que se teve na escolha anterior: acreditar em um caminho que se trilha sozinho, em silêncio. Uma subida íngreme que corre paralela a outros caminhos sem elevação, onde muitas pessoas estão paradas ou retornando ou caminhando sem rumo e que gritam que você está errado. Mas você não se importa, você segue. Vê, ainda, lá embaixo, as pessoas que te ignoram ou que te cumprimentam com soberba. Mas isso também não importa porque o que você está não precisa ser provado: é fato incontroverso. Você não precisa arrotar para os quatro ventos o que você é (temporariamente) e onde você está para ser tratado melhor. O tratamento que lhe é merecido é o tratamento que o ser humano merece: com respeito. Você não precisa de elevações físicas ou politicagens ou "social" para seu alpinismo na sociedade.
Na vastidão isolada do caminho, você se recorda de quando iniciou a subida e viu aqueles que estão lá em cima aplaudindo suas palavras, emocionando-se com seu perfume e parabenizando-lhe pela visão ímpar. Você transcende e sente o amparo das pessoas que não tiveram a oportunidade divina que você está tendo, mas que conseguem enxergar o que você faz. E segue. Não desiste. Vale a pena por ter uma resposta dos outros. Vale a pena por ter uma resposta de si mesmo, por descobrir-se mais um pouco, a cada dia.
Nesse caminho, a luz tem que ser a sua. Se você não tem, tem que aprender a produzi-la porque não há iluminação e nem outros para te iluminar. Isso porque você só achará a luz dos outros quando achar a sua própria luz. aí, a luz deles não vai servir para te ajudar, mas para se agregar à sua e para iluminar cada vez o caminho.

A iluminação muda.
Os atores mudam.
Mas o caminho é o mesmo: o da fé, da luta por si, do caráter de quem pode perder mas não desiste e não se conforma nem se formata à imposição dos outros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário