Loucos
in Litterae Bellerophontis, de t. h. abrahão
Somos loucos. Loucos que dançam sem música, loucos que esquecem os óculos na geladeira para ver o frio deserto do real. Loucos que consideram o amor uma flor que desabrocha na margem de um riacho. Loucos que sabem que esta flor geralmente apodrece com o tempo. Loucos que defendem a antropologia do fracasso, que exaltam o fato de que quanto mais evoluímos, mais ficamos desinteressantes. Loucos que sabem ser extremamente sutil a diferença que separa o indivíduo do indevido. Loucos armados com a vexata quaestio: qual seria o recurso mais abundante no que concerne ao meio social? Loucos com resposta pronta: a estupidez humana. Loucos a perceberem que as folhas de papel higiênico são mais asseadas que muitas folhas de jornal. Loucos que bebem do cálice das ironias contemporâneas logo de manhã. Loucos que se sabem solitários, pois antes só que metafisicamente acompanhado. Loucos que não esbanjam o desprezo, pois há muitas pessoas necessitadas. Loucos, sobretudo, por notarem que o mundo é um instante às avessas, e às pérolas dão-se porcos. Loucos, munidos de vocábulos incultos e belos que impreterivelmente traem; loucos que, feito poetas, traem, traduzem e trazem a traição — agora mais potente. Loucos maquiavélicos: antes ser vil que servil. Loucos, autores marginais, tais como o Idem Ibidem, este imenso autor que ninguém comenta. Loucos que se felicitam por não existirem cassinos da escrita, pois, caso contrário, seria certo que muitos já teriam se arruinado em jogos de palavras. Loucos que conhecem poemas muito bem escritos, mas pesados demais pela leveza que carregam. Loucos no precipício, onde o princípio é sempre uma altura apropriada — nem que seja para arruinar tudo o que se aspira. Loucos com opiniões, loucos que soletram seus medos, loucos que se perdem nas distâncias e logo encontram novo lar. Loucos que consideram os dogmas a tradução de nossas vontades reprimidas. Loucos que traduziram a ética como um exercício com recursos limitados. Loucos, no pó das estrelas, nas crateras abertas por bombas sinápticas, loucos que podem responder qualquer interrogação com apenas uma resposta: data venia. Louco, fou, skør, verrückt, τρελός, maf, pazzo, псих, nebun, galen? Data venia.
Somos loucos. Loucos que dançam sem música, loucos que esquecem os óculos na geladeira para ver o frio deserto do real. Loucos que consideram o amor uma flor que desabrocha na margem de um riacho. Loucos que sabem que esta flor geralmente apodrece com o tempo. Loucos que defendem a antropologia do fracasso, que exaltam o fato de que quanto mais evoluímos, mais ficamos desinteressantes. Loucos que sabem ser extremamente sutil a diferença que separa o indivíduo do indevido. Loucos armados com a vexata quaestio: qual seria o recurso mais abundante no que concerne ao meio social? Loucos com resposta pronta: a estupidez humana. Loucos a perceberem que as folhas de papel higiênico são mais asseadas que muitas folhas de jornal. Loucos que bebem do cálice das ironias contemporâneas logo de manhã. Loucos que se sabem solitários, pois antes só que metafisicamente acompanhado. Loucos que não esbanjam o desprezo, pois há muitas pessoas necessitadas. Loucos, sobretudo, por notarem que o mundo é um instante às avessas, e às pérolas dão-se porcos. Loucos, munidos de vocábulos incultos e belos que impreterivelmente traem; loucos que, feito poetas, traem, traduzem e trazem a traição — agora mais potente. Loucos maquiavélicos: antes ser vil que servil. Loucos, autores marginais, tais como o Idem Ibidem, este imenso autor que ninguém comenta. Loucos que se felicitam por não existirem cassinos da escrita, pois, caso contrário, seria certo que muitos já teriam se arruinado em jogos de palavras. Loucos que conhecem poemas muito bem escritos, mas pesados demais pela leveza que carregam. Loucos no precipício, onde o princípio é sempre uma altura apropriada — nem que seja para arruinar tudo o que se aspira. Loucos com opiniões, loucos que soletram seus medos, loucos que se perdem nas distâncias e logo encontram novo lar. Loucos que consideram os dogmas a tradução de nossas vontades reprimidas. Loucos que traduziram a ética como um exercício com recursos limitados. Loucos, no pó das estrelas, nas crateras abertas por bombas sinápticas, loucos que podem responder qualquer interrogação com apenas uma resposta: data venia. Louco, fou, skør, verrückt, τρελός, maf, pazzo, псих, nebun, galen? Data venia.
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